Os participantes do projeto reuniram-se em meados de outubro para se apresentar, trocar ideias e falar do andamento dos trabalhos de conservação de 3 espécies de árvores nativas do Brasil ameaçadas de extinção
Por Tânia Rabello
A urgente necessidade de garantir a preservação de árvores nativas do Brasil ameaçadas de extinção não pode esperar que a pandemia de covid-19 acabe. Por isso, graças à tecnologia e à internet, o andamento de um importante projeto de multiplicação de três espécies nativas da Mata Atlântica pôde ser relatado, em reunião virtual, ao seu patrocinador e, a partir daí, definidos mais alguns passos. A ocasião serviu também para uma apresentação formal de cada um dos envolvidos no projeto.
No dia 19 de outubro, um grupo de integrantes do Jardim Botânico Araribá (JBA), de Amparo (SP), participou de reunião virtual com Jean-Christophe Vié, diretor-geral da Fondation Franklinia, da Suíça; Cybele da Silva, presidente da Federação das Reservas Ecológicas Particulares do Estado de São Paulo (Frepesp), e a gerente de projeto de conservação de plantas Noelia Alvarez, da ONG britânica Botanic Gardens Conservation International (BGCI).
Essas três entidades estão envolvidas, em parceria com o JBA, no projeto de preservação de três espécies nativas da Mata Atlântica: o jacarandá-da-bahia (Dalbergia nigra); o cedro-do-brejo (Cedrela odorata) e o jequitibá-rosa (Cariniana legalis), todas as três ameaçadas de extinção.
Como financiadora do projeto, a Franklinia Fondation, por meio de Jean-Christophe, solicitou a reunião para acompanhar o andamento dos trabalhos. A ideia, ao fim de três anos, é formar e plantar 2.500 mudas dessas três espécies em 180 hectares de Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs) parceiras do projeto: a Duas Cachoeiras, em Amparo; a Fazenda Serrinha, de Bragança Paulista; a Estância Jatobá, de Holambra; a Amadeu Botelho, de Jaú; a Porto do Ifé, de Colômbia, e a Renópolis, de Espírito Santo do Pinhal. Essas RPPNs foram escolhidas porque estão situadas em floresta estacional semidecídua. As mudas estão sendo formadas pelos viveiros parceiros do projeto: Ambiental Mudas, de Araraquara, viveiro Oiti, de Holambra, e o Jardim Botânico de Jundiaí, todos de São Paulo.
Da conferência virtual, participaram, além dos três acima citados, Guaraci Diniz Jr. (diretor-geral do JBA); o engenheiro agrônomo Emilson Rabelo, gerente do Ambiental Mudas; os proprietários do Viveiro Oiti, Flores Welle e Juliana Valentini; a jornalista Tânia Rabello; responsável pela comunicação do JBA; a estilista e professora têxtil Cristiane Bertoluci, pesquisadora do JBA em fibras naturais; o biólogo Luiz H. Baqueiro, pesquisador do JBA; a engenheira agrônoma e advogada Eliana Mattos, pesquisadora do JBA; a advogada Denise Yagi, diretora da ONG Grupo de Estudos e Ações Ambientais (GAEA) e o engenheiro florestal Thiago P. Pires, coordenador geral do Jardim Botânico de Jundiaí.
Após a apresentação de cada um dos membros e sua função dentro do projeto e também da ONG GAEA – que é a gestora do projeto, juntamente com o JBA –, foi relatada a situação atual do projeto, os próximos passos e como a pandemia de coronavírus, inevitavelmente, desacelerou ou dificultou alguns trabalhos.
Outro contratempo foi um clima mais seco do que o esperado este ano. Rabelo, do Ambiental Mudas, esclareceu, por exemplo, que o grupo técnico envolvido com a coleta de sementes e a formação de mudas decidiu adiar o plantio em campo definitivo para novembro de 2021 – início da próxima estação chuvosa. “Será uma garantia maior para que as plantas se estabeleçam”, informou. O plano inicial era realizar o plantio já no fim de 2020, mas um período de seca acima do esperado obrigou ao redirecionamento da data.
Um momento da reunião que deixou os participantes bastante satisfeitos foi quando Thiago P. Pires, do Jardim Botânico de Jundiaí, mostrou, ao vivo, as mudinhas no viveiro, já vigorosamente brotadas e em pleno desenvolvimento. São 330 mudas de jequitibá-rosa e jacarandá-da-bahia. Thiago explicou, porém, que não foi possível, em razão das restrições da pandemia, coletar mais sementes em unidades de conservação como o previsto – já que várias, por força de lei, tiveram de ficar fechadas por causa do isolamento social. De todo modo, Jean-Christophe ficou visivelmente satisfeito com o que viu – “Muito bonito”, disse ele, após a apresentação de Thiago.
Outra dúvida do representante da Fondation Franklinia foi quanto à garantia de que os locais onde as 2.500 mudas serão plantados ficarão preservados “para todo o sempre”. Sob este aspecto, Cybele, da Frepesp, e Guaraci, do JBA, esclareceram que a legislação brasileira garante isso. “Mesmo sendo reservas particulares, as RPPNs têm garantia legal de preservação e, a partir do momento em que são reconhecidas como RPPNs, são registradas nas matrículas da propriedade e passam a fazer parte do Sistema Nacional de Unidade de Conservação da Natureza (SNUC)”, explicou. “Além disso, como mais uma garantia de que as espécies estarão de fato em áreas indefinidamente preservadas, optamos pela parceria com a Frepesp.”
Outra dificuldade enfrentada por causa da pandemia e relatada na reunião foi o adiamento do curso sobre coleção, conservação e propagação de sementes, que seria dado por Noelia Alvarez, do BGCI. “Não pudemos fazer o treinamento de 2020; a ideia era eu ir para o Brasil para este curso, mas não foi possível”, disse Noelia, acrescentando que em algum momento de 2021 o curso deve ocorrer. “E deve ser presencial, porque é um treinamento sobre como coletar sementes e plantas.” Além disso, Noelia aventou a possibilidade de se encontrar um parceiro no Brasil especializado no assunto com quem se pudesse fazer trabalho de campo e interações online.
O distanciamento social e o cancelamento das aulas presenciais nas escolas de São Paulo também impediram que o andamento dos trabalhos com as espécies nativas – como coleta de sementes, quebra de dormência, semeadura e formação das mudas, que já são etapas cumpridas – pudesse ser acompanhado por alunos da rede pública de ensino, dentro da vertente de educação ambiental, conforme lembraram Thiago Pires e Guaraci Diniz.
De todo modo, Jean-Christophe mostrou-se bastante satisfeito com a situação atual do projeto e indagou se havia possibilidade de ele crescer para, por exemplo, incluir mais espécies de árvores nativas a serem preservadas ou, ainda, ampliar o número de unidades de conservação que poderiam abrigar as mudas. Guaraci, do JBA, explicou que, para o atual projeto, são aquelas seis unidades de conservação já participantes. “Elas se encaixam na exigência de estarem localizadas em áreas de floresta estacional semidecídua, hábitat de origem das três espécies de árvores contempladas no atual projeto”, disse. Adiantou, entretanto, que, quando ocorreu o chamamento para este projeto, houve 14 RPPNs que se ofereceram para participar, mas nem todas estavam no bioma ideal. “Na possibilidade de um novo projeto, com outras espécies de árvores nativas, poderemos incluir essas reservas”, finalizou.